Carnaval, festa popular e palco de manifestações

23/02/2018 - 11:30

Carnaval, festa popular e palco de manifestações

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Ricardo Moraes/Reuters

Afirmar que o carnaval é a festa popular mais celebrada pelos brasileiros não é novidade para ninguém, nem que, ao longo do tempo, tornou-se elemento da cultura nacional. Mas, o carnaval de 2018 escreveu um novo capítulo nesta rica história. Agora, carnaval também é palco de manifestações políticas.

O que iniciou-se nas ruas, antes mesmo do feriado, enquanto inúmeros bloquinhos entoavam o grito “Fora Temer!” pelo Brasil afora, conquistou um vulto internacional com manifestações nos sambódromos do Rio e de São Paulo.

“Pecado é não pular o Carnaval", provocou a Estação Primeira de Mangueira, numa referência ao prefeito do Rio de Janeiro e pastor evangélico, Marcelo Crivella. "Desobedecer para pacificar", cantou a Mocidade Independente de Padre Miguel. "Liberte o cativeiro social", pediu o coro do Paraíso do Tuiuti. "Salve a imigração", saudou a Portela.

Em São Paulo, a Império da Casa Verde usou a Revolução Francesa para falar do caos na política brasileira, com guilhotina e tudo.

O desfile da Paraíso do Tuiuti merece destaque. A agremiação, nascida no morro de mesmo nome, em São Cristovão, no Rio de Janeiro, surpreendeu o público durante o desfile de domingo à noite e conseguiu enorme repercussão nas redes sociais. Com o samba enredo “Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão?”, a escola criticou as condições de trabalho no país e o atual Governo, responsável pela reforma trabalhista aprovada no ano passado.

 

Se a comissão de frente da escola trouxe o grito da liberdade, mostrando escravos açoitados, saídos da senzala, o último carro veio com um vampiro vestido com a faixa presidencial, que caracterizava  Michel Temer. Ele estava em cima do carro chamado ‘‘neo tumbeiro’’, ou seja, um navio negreiro dos tempos atuais. Na avenida os gritos "Fora Temer" deram o tom da arquibancada. Entre o último e o primeiro carro, o desfile de 29 alas e 3.100 componentes, ainda trouxe as fantasias de  ‘‘manifestoches’’ - integrantes vestidos de verde e amarelo, cor que marcou os protestos a favor do impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff. Estes eram manipulados por uma mão invisível e encaixados em patos amarelos - símbolo das reclamações contra o antigo governo feitas pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Eles carregavam nas mãos panelas, outro símbolo dos protestos.

“Como falávamos da exploração do homem pelo homem queríamos incluir a mitigação dos direitos sociais. Através dos patinhos você representa uma situação anterior na qual os direitos eram bem protegidos e a partir do momento em que uma nova ordem política toma o país você tem novas reformas que, na ótica da escola, tiram direitos sociais de uma parcela da população. A escola quis questionar se quem pediu essa mudança não é também vítima. Essa pessoa que foi para a rua não tem esses direitos cortados também?”, ressaltou Thiago Monteiro, diretor de Carnaval da escola, em entrevista ao EL PAÍS.

COBERTURA DA MÍDIA GOLPISTA - As críticas explícitas da Paraíso do Tuiuti deixaram em silêncio os comentaristas da TV Globo, que transmitiam ao vivo os desfiles de Carnaval. Enquanto as alas anteriores eram explicadas em detalhes, a dos "manifestoches" recebeu um rápido e único comentário de "manipulados, fantoches". Nas redes sociais, a escola foi louvada pela "coragem" das críticas.

Para o jornalista Florestan Fernandes Júnior, nada é mais revelador da escravidão do jornalismo brasileiro que o silêncio ensurdecedor no momento em que a última ala da Paraíso do Tuiuti entrou na Marquês de Sapucaí. “Ninguém no estúdio da Globo se atreveu a narrar o que via. Uma cena patética e constrangedora. Durante longos minutos as imagens mostravam uma plateia vibrando com o carro alegórico que trazia em destaque um Temer Vampirizado. Só faltou a Tuiuti mostrar os repórteres escravos dos senhores da comunicação que não têm liberdade sequer para dizer o que todos viram em cores e ao vivo  “várias notas falsas de dólares", disse o jornalista.

 

 

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